sábado, 1 de maio de 2010

Ainda somos co-responsáveis pela Criação

No final dos anos oitenta, quando entrávamos no arroio Pampa, na periferia de Novo Hamburgo (RS), poluído pelos curtumes e fábricas de calçados, nós tínhamos como tarefa retirar o lixo e expô-lo nas vias públicas do bairro. A intenção era limpar o arroio e ao mesmo tempo envergonhar quem ali se confrontava com os detritos que havia jogado dentro daquele corpo d’água. Mas o objetivo era maior: lutávamos para que os poderes públicos obrigassem as empresas poluidoras a tratar seus poluentes.

Passados mais de vinte anos, o problema da nossa relação com o ambiente natural que nos cerca só se fez crescer. O Brasil todo acompanhou a gigantesca mortandade de peixes ocorrida no rio dos Sinos (onde o arroio Pampa, não por acaso, deságua). Num mundo cada vez mais poluído por des-informações veiculadas instantaneamente pela TV e pela internet, damos pouca ou nenhuma importância às violações dos direitos que acontecem debaixo do nosso nariz. O longe ficou perto e o perto ficou longe. Vivemos numa época em que a história é instantânea. Nada mais tem a ver conosco, a não ser quando somos diretamente afetados, como no caso da violência. Assim, a Terra, o ambiente natural e as demais formas de vida são meros objetos a serem explorados.

Até mesmo as teologias e práticas pastorais que argumentavam em favor da posição humana como guardiãs e co-responsáveis pela Criação foram deixadas de lado e substituídas pelas teologias da prosperidade, onde o comércio direto com Deus é livre e estimulado. Competição, mercado, lucro, correria... onde está o olhar terno para com o outro, a outra?

É preciso afirmar que os valores defendidos pela economia de mercado são totalmente incompatíveis com qualquer preocupação séria pela defesa dos ambientes naturais e seus habitantes. A idéia do crescimento econômico ilimitado, que economistas da direita tanto celebram, está fortemente beaseada no fato de que os recursos naturais também seriam ilimitados. Só que esses recursos, como sabemos, são limitados.

Da mesma forma, o abismo que separa a teologia luterana da justificação por graça da ideologia do mercado é absolutamente intransponível. Deus nos criou assim como somos: perfeitos, perfeitas. Nosso valor é intrínseco, baseado no amor que Deus tem por nós. Valemos simplesmente porque somos. Nossa valorização jamais estaria condicionada àquilo que temos, produzimos ou consumimos, como sugere a ideologia do mercado consumista.

Charles Darwin estava errado quando afirmou que a competição entre as espécies foi o motor da evolução. Pesquisas recentes em Biologia estão mostrando que, ao invés de competição, foi a solidariedade simbiótica (parceria entre espécies para sobrevivência de ambas) a principal razão da evolução. A vida na terra se desenvolveu muito mais por causa da associação do que pela competição!

Continuamos co-criadores e co-criadoras do mundo. Apesar de muitas vezes destruirmos, desmatarmos, poluirmos, também temos a incrível capacidade de plantar, limpar, preservar, gerar vida. O belo, o sublime, o bom em nós vem escondido por detrás dos seus opostos.

P. Dr. Mauro B. de Souza
fonte: Portal Luteranos -www.luteranos.com.br

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